quinta-feira, 5 de março de 2015

1º Encontro das Mulheres RPGistas

Muito tem sido dito a respeito do 1º Encontro das Mulheres RPGistas. Muitos acham que é preconceito, outros acham que é necessário. Algumas mulheres defendem visceralmente o evento, mas vi outras dizendo que não concordam com algumas dessas manifestações. Bom, este é a minha opinião, mas não apenas isso. Este é também um pedido de ajuda! Não se engane. E ele é comprido, então antes de continuar a ler, tenha certeza de que quer realmente saber minha opinião sobre o Encontro das Mulheres RPGistas. Vamos lá então.

Eu tinha algo em torno de 9 ou 10 anos de idade quando voltava da escola pra casa. Eu gostava de voltar a pé, apesar de minha escola (particular) ficar a umas dez quadras de casa. Na ocasião usava uma imitação de quepe da cavalaria americana que meu pai tinha comprado para mim. Eu estava a um quarteirão de casa quando três meninos me derrubaram no chão e pegaram meu quepe. Foram embora andando e rindo da minha cara. 

Apesar de ser o conhecido "CDF", eu praticava todos os esportes da escola, e era confiante o suficiente para me virar medianamente em qualquer briga. Segui os três moleques até a escola deles, uma escola pública a duas quadras de minha casa. Cheguei a tempo de confrontá-los antes de entrarem e chamei-os de ladrões na frente de todos. Desafiei todos eles a me enfrentarem um de cada vez, se fossem realmente tão valentes. Eu estava pronto!

Fui literalmente espancado! Em determinado momento fiquei no chão protegendo o rosto e levando socos e chutes nem sei de quantos garotos. Talvez até de alguma menina do grupo. Eu estava aterrorizado e não conseguia tentar nenhuma reação. A situação só mudou quando um adulto amigo de nossa família viu e tirou o grupo de cima de mim, espantou a molecada e me levou pra casa, todo dolorido. Mas a dor não era o pior! O pior mesmo foi o medo!

Durante anos fui vítima do pânico irracional. Eu só saia na rua nos horários que não coincidiam com a hora de entrada e saída da tal escola. Naquele perímetro de duas quadras ao redor da escola eu sempre andava rápido e olhando para os lados, inquieto. Tinha medo de qualquer escola pública, porque meu medo irracional dizia que aquilo tudo poderia se repetir. Por quê? E quem disse que me importava com o motivo? Eu iria apanhar de novo, MUITO, e por qualquer motivo.

Sim, eu vivia aterrorizado. Um medo insano que me fez deixar de brincar ou encontrar com meus vizinhos de rua durante vários anos. Foi um processo longo para vencer o medo de ser espancado e voltar a sentir confiança em mim mesmo.

Mas por que essa história de infância meio humilhante?

A proposta do 1º Encontro de Mulheres RPGistas é falar sobre situações desagradáveis que mulheres passam em mesas e locais de jogo, entre outras. E não por discordarem sobre tipos de personagem ou rumos da história. Não por preferências de sistemas ou cenários. Não por discutirem regras, ou tradução, ou estilo de jogo. Mas sim por serem mulheres.

Simplesmente por serem mulheres acabam passando por momentos de desconforto por causa de piadas inapropriadas, situações indelicadas, comportamento abusivo ou o simples fato de outro(s) jogador(es) passarem dos limites do que seria um comportamento aceitável entre amigos.

Agora vai um convite a você, meu leitor. Imagine uma pessoa procurando por um grupo de jogadores com quem possa passar algumas horas se divertindo em mundos imaginários, uma simples diversão escapista para esquecer dos problemas do dia a dia, trabalho, estudos, família, mundo louco... Enfim, a simples vontade de encontrar pessoas com gostos semelhantes e esquecer um pouco a realidade.

Imagine agora essa pessoa rodeada de outras e sentindo-se em inferioridade, talvez mesmo física. Continue imaginando essa pessoa percebendo que os caras ao seu redor não se importam muito com ela ou sua personalidade, fazendo piadas humilhantes e desconsiderando suas ideias. Talvez seja pior, talvez os caras tentem abusar dela. Talvez... bom, para terminar esse exercício de imaginação, imagine que essa pessoa seja você!

É fácil dizer que você faria isso ou aquilo nesta ou naquela situação. Mas quem diz isso nunca pensa em se colocar NAQUELE CORPO que passou pela situação. Ninguém para e pensa como pode ser frágil a situação dessa pessoa ou como ela pode ficar em desvantagem diante de um grupo hostil. Simplesmente por ser mulher!

Eu já passei medo. Eu já passei humilhação. E não gostei.

A vida me deu o privilégio de ter várias amigas jogando comigo. Antes e depois dos jogos: amigas; durante o RPG: colegas de armas e aventuras. Não quero pensar em nenhuma delas passando por qualquer das situações de que tenho ouvido falar ou lido a respeito.

Então sim, acho importante o Encontro das Mulheres RPGistas acontecer para elas trocarem experiências. Para que possam conversar sobre como evitar ou lidar com situações desagradáveis em mesas de jogo. Para discutir como mostrar para a comunidade masculina os problemas que elas enfrentam. Para levantar a sua voz e poderem dizer que não aceitam serem tratadas com desprezo.

Esse é o meu pedido de ajuda. Não permita que isso aconteça. Não aceite que isso aconteça. Que as meninas tenham o direito de se divertir jogando e os rapazes tenham o direito de se divertir jogando ao lado delas.

Porque assim todos nós vencemos!

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